segunda-feira, 25 de julho de 2011

A carta branca e a proeminência do Planejamento




É natural, em qualquer gestão, que o equilíbrio entre centralização e descentralização penda em favor da segunda. A complexidade e a especialização dos assuntos, à parte o loteamento político das Pastas, terminam por exigir que os demais Ministérios e Secretarias desfrutem de um grau de autonomia relativamente confortável. Que cada área específica atue formulando sua própria política não deverá impedir, porém, que a figura de um órgão de planejamento central acompanhe, avalie e direcione os esforços da atuação estatal.

O desafio de harmonizar as metas setoriais em prol da eficiência no uso dos recursos públicos e da efetividade dos resultados entregues à população parece argumento bastante para que se fortaleça o papel de um órgão central – embora de modo algum seja o principal. A fim de identificar o verdadeiro papel que um setorial de Planejamento deve desempenhar é preciso, antes, recorrer a um documento que precede o processo eleitoral: o Plano de Governo. É absolutamente fundamental, além de uma obviedade, que um governante eleito inicie seu mandato de posse de um plano detalhado que estabeleça compromissos sobre o que pretende alcançar nos próximos quatro anos em cada uma de suas esferas de atuação. Apresentá-lo durante o processo eleitoral (uma peça efetiva, e não uma exigência pró-forma) legitima sua atuação e diminui a turbulência política que surge futuramente - tanto na fase de composição do seu Secretariado quanto na etapa posterior de cobrança de resultados. A prática de entregar setores do governo de “porteira fechada” a um partido - ou setor de partido - acaba por eternizar feudos políticos incomunicáveis e completamente alheios a qualquer compromisso de accountability. Trata-se do sistema de “carta branca”, que opera em dois pólos onde ambos perdem: a população não sabe qual será a linha de atuação do governante eleito, limitando suas opções de escolha;  este tampouco se importa com os rumos de uma parcela importante dos setoriais do seu governo, perdendo controle sobre eles. Um plano prévio que avance sobre bases quantitativas funciona como uma espécie de pacto social que blinda o governo eleito contra pressões políticas internas – mesmo que forneça subsídios para eventuais críticas oposicionistas.


Uma vez explicitado um Plano de Governo que estabeleça resultados mensuráveis, estará pavimentado o caminho para que o órgão central ganhe força e atue com responsabilidades definidas: zelar pelo cumprimento das metas acordadas; avaliar qualitativamente a atuação dos órgãos setoriais segundo critérios objetivos; estabelecer as diretrizes para a atuação multissetorial e para a formulação de programas com foco em resultados; e, finalmente, promover os ajustes orçamentários e de planejamento que se façam necessários durante o período de governo – as correções de rota.


O que se deve atentar quando se discute a “relação de proeminência” proposta no título é para o fato de que nunca caberá a um órgão de Planejamento imiscuir-se indiscriminadamente nos assuntos setoriais, tampouco decidir internamente sobre os rumos gerais do Estado sem fazer referência ao Plano de Governo que o legitima. Tal comportamento, além de politicamente impossível, é hoje tecnicamente inviável. O máximo de proeminência que pode haver, no sentido hierárquico da palavra, é o poder de penalizar – via realocação de recursos orçamentários - os órgãos setoriais que não cumpram os resultados contratualizados.


Uma vez que o setorial de Planejamento esteja de posse de suas plenas competências, legalmente formalizadas e politicamente apoiadas pela mais alta instância da Administração – o Chefe do Executivo – estará definitivamente implementada na gestão pública algo tão ou mais caro ao cidadão que a tão em voga transparência fiscal: a transparência de rumos.